Nove meses após ter contraído Covid-19, a francesa Pauline Oustric, de 27 anos, ainda sofre de inúmeros sintomas ligados à doença, que a impedem de levar a vida que tinha antes.

A jovem, que costumava correr e participar de competições de dança, hoje tem dificuldades para fazer pequenos esforços físicos. Uma caminhada de mais de 15 minutos provoca um grande cansaço que a obriga a repousar durante horas ou até mesmo um dia inteiro.

Seus problemas respiratórios, digestivos e de raciocínio melhoraram, mas, 40 semanas depois de ser infectada, ela ainda sofre de dores torácicas, na altura do coração, que a impedem de se movimentar normalmente, além de acufenos (zumbido nos ouvidos).

O caso de Pauline, que não precisou ser hospitalizada quando contraiu o novo coronavírus, está longe de ser isolado. Milhares de pessoas sofrem da chamada “Covid-19 longa”, com sintomas que afetam vários órgãos do corpo e perduram meses depois do início da infecção.

“Eu ainda não recuperei minha saúde, que era perfeita, nem minha energia de antes”, diz Pauline, que afirma viver desde março em “uma montanha russa”, alternando dias bons e ruins por causa dos sintomas cíclicos.

Essa forma prolongada da doença, observada por alguns médicos, já vem chamando a atenção das autoridades médicas há algum tempo.

Em agosto, a Organização Mundial da Saúde (OMS) reconheceu a existência de sequelas a longo prazo da Covid-19 após uma videoconferência de seu diretor-geral, Tedros Adhanom Ghebreyesus, com pacientes de várias nacionalidades afetados por sintomas persistentes da doença.

“Nós sabemos relativamente pouco ainda sobre os efeitos a longo prazo da Covid-19. Nos engajamos a colaborar com os países para que essas pessoas possam beneficiar dos serviços que precisam e para fazer avançar as pesquisas em seu favor”, afirmou o diretor-geral da OMS após o encontro.

Pauline, que participou dessa conferência, é uma das fundadoras e presidente da associação francesa “AprèsJ20” (“Depois do 20° dia”), nome que faz referência ao fato de que sintomas múltiplos da Covid-19 se prolongam além do prazo normalmente indicado para quem não desenvolveu formas graves da doença.

“AprèsJ20” começou com uma hashtag lançada em abril no Twitter, seguida pela criação de grupos em outras redes sociais, com milhares de relatos de pessoas que diziam sofrer de sintomas prolongados da Covid-19.

Em muitos casos, os problemas persistentes eram ligados a fatores psicológicos, como ansiedade.

Na França, parte dos pacientes de Covid-19 longa reunidos na hashtag “AprèsJ20” formou o grupo da associação que leva o mesmo nome.

Ela tem quatro objetivos: o reconhecimento da Covid-19 longa baseada nos sintomas (e não unicamente em testes) para efeitos de indenização pelo Seguro Social francês, tratamentos médicos pluridisciplinares devido ao fato de a doença afetar diferentes órgãos, melhor acesso a informações para médicos e público, além da realização de pesquisas científicas na área.

No início da pandemia, não havia na França testes disponíveis em ampla escala para a população como atualmente. Por isso, muitas pessoas que ainda apresentam os sintomas da doença meses depois não tiveram, na época, o diagnóstico confirmado por meio de testes.

A associação também atua em colaboração com médicos e pesquisadores para aprofundar informações sobre a Covid-19 persistente.

Comunidades on-line de pacientes do mesmo tipo também surgiram em outros países, como o Reino Unido.

No dia em que concedeu a entrevista à BBC News Brasil, a presidente da AprèsJ20 havia passado antes quatro horas deitada devido a um grande cansaço.

Pauline, doutoranda em nutrição, era bem ativa antes da doença: além dos estudos, desenvolvia uma startup, participava de associações de mulheres de negócios e praticava esportes regularmente.

“Hoje, não me sinto mais capaz de trabalhar tanto como antes. Mas mesmo trabalhando menos, me sinto mais cansada”, diz a jovem, que colocou uma cama ao lado da mesa do computador para facilitar sua necessidade de repouso constante.

Pauline morava na Inglaterra, onde contraiu o Sars-CoV-2, e precisou voltar para a casa dos pais na França porque, segundo ela, não pode mais fazer tudo sozinha e precisa de um acompanhamento diário.

Pauline afirma que médicos identificaram nela uma disfunção de seu sistema neurovegetativo, que regula o corpo, o que poderia explicar seus problemas respiratórios, cardíacos, digestivos, musculares e de confusão mental.

G1