O ministro Celso de Mello, do STF (Supremo Tribunal Federal), suspendeu nesta segunda-feira (17) o julgamento de dois procedimentos disciplinares contra o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba.
Os julgamentos seriam realizados nesta terça-feira (18) pelo CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público).
Um dos processos que seria analisado foi apresentado pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL) e o outro, pela senadora Kátia Abreu (PP-TO). As decisões representam mais uma vitória para a Lava Jato no STF.?
O caso do powerpoint contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) segue na pauta do conselho, mas não há certeza se a análise de fato acontecerá nesta terça. O caso está na pauta do CNMP há meses e, até agora, não foi chamado a julgamento pelos conselheiros.
Mais cedo, nesta segunda, o ministro do STF Luiz Fux já havia suspendido os efeitos da sanção de advertência imposta a Deltan em novembro do ano passado.
No despacho, Celso de Mello afirmou que é “inaceitável a proibição ao regular exercício do direito à liberdade de expressão” membros do Ministério Público e afirma que limitar esse direito “revela-se em colidência com a atuação independente e autônoma garantida ao Ministério Público pela Constituição”.
Celso ressaltou que o direito de criticar, de opinar e de dissentir, independentemente do meio de veiculação, “representa irradiação das liberdades do pensamento, de extração eminentemente constitucional”.
O ministro determinou a suspensão dos procedimentos até o julgamento definitivo das ações em curso no Supremo sobre o caso. Ele classificou como “essencial” proporcional a livre circulação de ideias e ressaltou que essa prerrogativa vale tanto na esfera individual quanto coletiva.
“É por isso que se impõe construir espaços de liberdade, em tudo compatíveis com o sentido democrático que anima nossas instituições políticas, jurídicas e sociais, como o Ministério Público”, disse.
Segundo o magistrado, a autonomia do Ministério Público é temida por muitos. “Sabemos que regimes autocráticos, governantes ímprobos, cidadãos corruptos e autoridades impregnadas de irresistível vocação tendente à própria desconstrução da ordem democrática temem um Ministério Público independente”, escreveu.
Na decisão proferida mais cedo por Fux, o ministro havia suspendido os efeitos de uma advertência imposta em novembro do ano passado ao coordenador da força-tarefa da Lava Jato.
Na prática, o despacho de Fux havia tornado mais distante o afastamento do procurador da chefia da Lava Jato, uma vez que o histórico do profissional pode ser considerado um agravante para o conselho.
A decisão representa uma vitória para a operação e indica como a ascensão de Fux à presidência do STF, em setembro, pode dar uma sobrevida à Lava Jato, que tem sofrido derrotas tanto na PGR (Procuradoria-Geral da República) quanto no Supremo.
A proximidade de Fux com a operação já havia se tornado evidente no episódio da Vaza Jato, revelado pelo site The Intercept Brasil. Em uma das conversas de Deltan com o então juiz da operação, Sergio Moro, ambos deixaram claro que o magistrado do Supremo era uma das esperanças para as investigações na corte.
Logo após a abertura do processo de impeachment contra Dilma Rousseff (PT), eles conversaram sobre o cenário na corte. “[Fux] disse para contarmos com ele para o que precisarmos, mais uma vez […] Os sinais foram ótimos”, relatou Deltan. Moro respondeu: “Excelente. In Fux we trust”.
No caso de Renan, o parlamentar questiona a conduta do procurador por ter feito críticas no Twitter ao parlamentar. Segundo o senador, as declarações prejudicaram a campanha dele à presidência do Senado no ano passado.
Já Kátia Abreu acusa Deltan de ter tido ganhos econômicos de forma ilegítima ao ser remunerado para realizar palestras.
Em entrevista à CNN na noite desta segunda-feira, após a decisão de Fux, mas antes da de Celso, Deltan disse que agiria de modo diferente em relação ao powerpoint usado para apresentar a denúncia contra o ex-presidente Lula, em 2016.
“A forma de apresentação eu faria diferente para evitar a polêmica e as críticas que geraram. A questão é que não rendeu bons frutos, rendeu discussão desnecessária”, afirmou.
Ele fez a mesma avaliação sobre os comentários em que lamentava a possível vitória de Renan para o comando do Senado. Apesar disso, o procurador disse que agiu dentro da lei em todas as ocasiões e que não merece ser punido.
Segundo ele, em nenhum dos procedimentos em curso no CNMP estão caracterizados “fatos graves e comprovados”, requisitos exigidos para determinar o afastamento de um membro da carreira.
Deltan afirmou que o julgamento no CNMP indicará o que integrantes do Ministério Público podem “esperar do futuro, se poderão seguir atuando de modo combativo ou se vão ter que passar a temer represália no seu trabalho”.
MATHEUS TEIXEIRA
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)