O Brasil teve alta de 7% no número de assassinatos de janeiro a maio de 2020 em comparação com o mesmo período do ano passado. Já o mês de maio deste ano registrou estabilidade (-0,3%) em relação ao mesmo mês de 2019. É o que mostra o índice nacional de homicídios criado pelo G1, com base nos dados oficiais dos 26 estados e do Distrito Federal.

De acordo com a ferramenta, houve 19.382 mortes violentas de janeiro a maio deste ano. No mesmo período no ano passado, foram 18.120. A alta de 7% ocorre mesmo em meio a pandemia da Covid-19, quando estados e municípios passaram a adotar medidas de isolamento social.

Já considerando o mês de maio foram 3.529 vítimas de assassinatos, contra 3.540 em 2019, uma redução de 11 mortes.

A alta no início deste ano vai na contramão de 2019, que teve uma queda de 19% no número de assassinatos em todo o ano. O Brasil teve cerca de 41 mil vítimas de crimes violentos no ano passado, o menor número desde 2007, ano em que o Fórum Brasileiro de Segurança Pública passou a coletar os dados.

G1 já havia antecipado que um terço dos estados tinha apresentado alta nos assassinatos no último trimestre de 2019, o que acendeu o alerta para uma possível reversão da tendência de queda da violência no país, segundo especialistas. A reversão foi confirmada no início de 2020.

Os dados apontam que:

  • o país teve 3.529 assassinatos em maio de 2020
  • houve 11 mortes a menos na comparação com o mesmo mês de 2019, uma queda de 0,3%
  • já de janeiro a maio, foram 19.382 crimes violentos, uma alta de 7%
  • 18 estados do país apresentaram alta de assassinatos nos primeiros cinco meses do ano
  • 7 estados e o DF registraram queda no período; 1 manteve o mesmo número de mortes.

O levantamento faz parte do Monitor da Violência, uma parceria do G1 com o Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV-USP) e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Pandemia do coronavírus e isolamento

O mês de março foi o período em que a pandemia do coronavírus ganhou força no Brasil. A primeira morte foi registrada em 16 de março, em São Paulo.

Foi também o mês em que vários estados começaram a aplicar medidas de fechamento de comércio e isolamento social. O Rio de Janeiro publicou um decreto com as medidas de restrição de circulação e funcionamento dos serviços em 17 de março. Já São Paulo adotou a quarentena a partir de 24 de março.

Já em abril e maio, praticamente todo o Brasil conviveu com medidas de isolamento social. Mesmo com a circulação de pessoas mais restrita, porém, houve um aumento de 8% no número de assassinatos em abril, o que chamou a atenção. Em maio, em comparação com o mesmo mês de 2019, o número de assassinatos ficou estável (-0,3%).

Os dados de janeiro a maio de 2020 mostram, porém, uma alta de 7% no número de crimes violentos em comparação com o mesmo período do ano passado.

Para Bruno Paes Manso, do NEV-USP, esse crescimento no contexto atual de quarentena é preocupante. Ele afirma que ainda é cedo para apontar as causas por trás da alta da violência, mas aponta que a hipótese relacionada a um aumento nos conflitos entre grupos criminosos se sobressai.

“Esse tipo de homicídio não está relacionado a conflitos cotidianos e ocasionais, como os decorrentes de briga em bar, em trânsito etc. São assassinatos relacionados a disputas de poder, de mercado, de território, envolvendo execuções sumárias previamente planejadas. Os homicidas vão buscar a vítima não importa onde ela esteja”, afirma.

“O crescimento da violência em ações da polícia também tem chamado a atenção em alguns estados, como Rio, São Paulo e Bahia. Essas ações policiais acabam muitas vezes desestabilizando a cena criminal nos territórios, aumentando a violência.”

Paes Manso diz que ainda é cedo para identificar as causas dessas dinâmicas, mas algumas questões podem ser levantadas. “Será que as autoridades estaduais estão fragilizadas com a crise criada pelo coronavírus? Será que os governos têm encontrado dificuldades para controlar os excessos das polícias? A percepção da fragilidade das instituições levou quadrilhas rivais a disputarem poder e territórios ou a polícia a agir com excesso de violência?”, questiona.

O pesquisador afirma, porém, que não há um padrão claro entre os estados, já que alguns apresentaram queda, enquanto outros, como o Ceará, tiveram altas expressivas. “O aumento da violência no Ceará se destaca em relação aos demais estados. Existem relatos de disputas nos territórios entre facções. O governo precisa identificar o conflito e interromper o ciclo de disputas. O crescimento dos assassinatos mesmo durante a pandemia exige atenção dos governos.”

Nordeste puxa a alta

Samira Bueno, diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, também cita o estado do Ceará e seus números elevados. Para ela, um dos principais motivos por trás da alta de assassinatos no país foi o motim de parte da Polícia Militar que aconteceu no estado em fevereiro.

O Ceará, inclusive, foi o estado com a maior escalada de violência do Brasil. Nos primeiros cinco meses do ano, o número de vítimas dobrou, passando de 938 para 1.879.

O ano de 2020 teve o mês de fevereiro mais violento do estado desde pelo menos 2013, com mais de 450 mortes. Desse total, 312 aconteceram durante os 13 dias da greve policial. Houve uma média de 26 mortes por dia. Antes, a média era de 8 por dia.

Para o professor da Universidade Federal do Ceará (UFC) Luiz Fábio Silva Paiva, a greve foi um fato circunstancial. “Obviamente que os grupos armados que estavam envolvidos em acerto de contas e disputa pelo tráfico encontraram uma ótima oportunidade para intensificar determinadas ações. Mas a greve não é determinante. Em janeiro [antes da greve], a gente já tinha uma situação grave. Depois, em abril, maio e junho, esses conflitos se intensificaram, com invasões de bairros e com ocupação de territórios de grupos inimigos”, afirma.

“São situações que a gente observa que elas acontecem independente da ação policial. Até porque a maneira como as nossas polícias atuam pouco tem incidido no aumento ou na diminuição dos homicídios”, diz Paiva. “A gente fica muito mais à mercê da dinâmica interna dos grupos criminosos. Quando intensificam confronto, tem número mais alto, e quando recuam, tem número mais baixo.”