O ministro da Educação, Abraham Weintraub, afirmou nesta sexta-feira (17) que os recursos resgatados pela Lava Jato e direcionados para sua pasta não foram usados porque não havia um projeto pronto para aplicação do dinheiro na educação infantil.
A Folha de S.Paulo revelou que o MEC (Ministério da Educação) foi a única pasta, entre as sete que receberam parte desses recursos, que não utilizou nenhum centavo em 2019. Ao MEC, coube a maior fatia do fundo –mais de R$ 1 bilhão do total de R$ 2,6 bilhões–, mas a pasta não fez nenhum empenho.
A intenção de alocar os recursos recuperados da Lava Jato na educação, sobretudo em creches, tem sido mencionada por membros do governo desde o primeiro semestre de 2019.
O STF (Supremo Tribunal Federal) validou em setembro passado o acordo sobre a destinação do dinheiro. Em novembro, os recursos já chegaram aos ministérios.
Apesar de ter passado esse período, o ministro disse que o MEC não teve tempo para finalizar um projeto para alocação.
“[O dinheiro] não foi usado porque não estava pronto o projeto”, disse Weintraub durante entrevista em Brasília para falar sobre um balanço do Enem 2019. Segundo ele, o governo prepara o que será o maior programa de creches “que o mundo ocidental” já viu.
Como a reportagem mostrou, a indefinição dentro do MEC para aplicar o recurso travou sua execução. O governo Jair Bolsonaro queria usá-lo para viabilizar um projeto de voucher para creches, no qual entregaria às famílias dinheiro para pagar creche particular.
Mas há entraves legais para o gasto de dinheiro público em instituições com fins lucrativos na educação infantil. A consultoria jurídica do MEC tem procurado uma solução, mas relatos de integrantes do ministério indicam que essa opção –uma aposta da gestão Bolsonaro para ampliar o acesso– já não é mais certa dentro do governo.
Não houve detalhes na entrevista sobre o novo projeto relacionado à educação infantil. A pasta não respondeu questionamentos sobre o tema encaminhados na quinta-feira (16) pela reportagem.
No ano passado, o MEC gastou apenas R$ 58 milhões para a construção de creches, o menor valor desde pelo menos 2013. A educação infantil é de responsabilidade das prefeituras, mas o governo federal mantém uma política de repasses para obras e manutenção de matrículas.
Ao comentar a reportagem, o ministro ainda atacou a Folha de S.Paulo e este repórter, um dos dois que assinam o texto. Na véspera, ele já havia dirigido ataques diretos a outra repórter do jornal.
“Do mesmo jeito que você estava errado no ano passado, falando que não teria Enem, e a Folha estava errada, estou afirmando que a gente vai utilizar esse R$ 1 bilhão este ano”, disse Weintraub. “Mas se no ano passado foi alardeado e estava equivocado, gerou terrorismo, eu gostaria que ele [o jornalista] deixasse a profissão e buscasse outra, vai ser pipoqueiro”.
Em 2019, a falência da gráfica que imprimia a gráfica do Enem desde 2009 colocou em risco a realização do exame dentro dos prazos. Reportagem da Folha de S.Paulo ainda mostrou que uma diretoria do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), responsável pelo Enem, ficou até agosto vazia, mais tempo sem titular do que ocupada.
O texto informava que sobre riscos para a realização do Saeb, avaliação da educação básica e cuja aplicação teve atrasos. O MEC e os órgãos ligados à pasta passaram por várias mudanças ao longo do ano passado. Alexandre Lopes, presidente do Inep, já é o terceiro a ocupar a vaga sob o governo Bolsonaro.
O Orçamento de 2020 não prevê dinheiro do fundo da Lava Jato, e, sem poder estourar o teto predeterminado, técnicos do governo agora discutem como evitar perder os recursos.
Uma hipótese analisada pela equipe econômica é que o Congresso tenha de aprovar –mais uma vez– um crédito para o ministério, como mostrou a reportagem desta sexta-feira.
No ano passado, o governo teve de pedir aos congressistas que o Orçamento fosse modificado para ampliar os gastos com educação e preservação ambiental sustentados pelo fundo da Lava Jato. Isso pode ser feito novamente em 2020, mas o governo já está com dificuldades de contornar o teto de gastos (limite de crescimento das despesas corrigido pela inflação).
Diante dessa amarra, o governo precisa escolher onde gastar, pois o espaço é limitado – como neste ano todo o espaço sob o teto foi usado e não há margem para ampliar os gastos, o aumento de uma despesa significa necessariamente o corte de outra.
Fonte: Folhapress