Febre alta, manchas vermelhas pelo corpo e dor nas articulações e atrás dos olhos. Esses são os sintomas mais conhecidos da dengue, que quando evolui para um quadro grave, apresenta riscos de lesões no fígado e hemorragias. Porém, os perigos da doença podem se manifestar de forma neurológica tempos depois, ou ainda sem que tenha havido necessariamente manifestação clínica dos sintomas clássicos.
Segundo especialistas ouvidos pela reportagem, entre 1% e 5% dos pacientes infectados pela dengue podem desenvolver encefalite, mielite, neuropatia, meningite e até Guillain-Barré –um distúrbio autoimune que provoca redução ou ausência de reflexos.
O mosquito Aedes aegypti pode causar problemas neurológicos tanto diretamente quanto indiretamente, explica o Augusto Penalva, supervisor da Equipe Médica da Neurologia do Instituto de Infectologia Emílio Ribas. O médico aponta três tipos de comprometimento que podem ocorrer:
– quando o encéfalo é comprometido pela inflamação sistêmica da doença. Não é o vírus que está agredindo diretamente o cérebro, mas sim a gravidade da doença sistêmica;
– a segunda é a própria invasão do vírus, que penetra no SNC (sistema nervoso central) e agride o cérebro de uma maneira direta, causando inflamação;
– quando o vírus causa doença imunomediada, ou seja, a infecção causa um erro do sistema imune e a inflamação ataca o próprio sistema nervoso, seja ele central ou periférico, causando um distúrbio autoimune.
Causas de problemas neurológicos pela dengue
As razões pelas quais a dengue pode afetar neurologicamente algumas pessoas mais do que outras ainda não é exato, mas há algumas pistas.
O coordenador da Neurologia do Hospital Japonês Santa Cruz, Flávio Augusto Sallem, explica que há quatro sorotipos de dengue (1, 2, 3 e 4) e que as pessoas infectadas pelos sorotipos 2 e 3 costumam apresentar mais riscos de problemas neurológicos.
“Essas alterações neurológicas também são muito mais comuns em crianças e adolescentes, mas também podem acontecer em pacientes adultos e têm sido descritas mesmo em pacientes acima de 80 anos. Isso pode estar relacionado à juventude do sistema imunológico ou à falta de uma experiência do sistema imunológico”, diz.
Já o neurologista Augusto Penalva esclarece que problemas no sistema nervoso podem acontecer com quem já teve uma sensibilização antigênica, ou seja, já teve outras arboviroses, como zika, chikungunya, febre amarela e a própria dengue (reinfecção).
“O sistema nervoso costuma ser mais comprometido nos quadros mais graves de dengue, mas isso não significa que pacientes assintomáticos não possam desenvolver questões neurológicas”, diz Penalva.
Tratamento e prevenção
Os neurologistas afirmam que, assim como a própria dengue, possíveis consequências neurológicas não têm um tratamento específico. Isso dependerá do quadro e da evolução de cada paciente.
O tratamento das consequências neurológicas, após a dengue ser curada, pode ser feito com corticóide ou imunoglobulina, a depender do tipo de complicação que a pessoa apresentar, diz Sallem. O médico também menciona a importância de se ter um acompanhamento médico e buscar sempre um hospital em caso de complicações.
Ambos os especialistas dizem que, além das medidas de controle de vetor, há um item fundamental para prevenir esses casos: a vacina.
Ainda indisponível em larga escala no país, a vacina contra a dengue começou a ser aplicada pelo SUS (Sistema Único de Saúde) em crianças de 10 a 14 anos em municípios selecionados. Alguns laboratórios particulares e drogarias também vendem o imunizante.
A vacina faz com que o teu sistema imune fique mais adequado, diminuindo a chance de casos graves e complicações neurológicas, mesmo ainda com processo inflamatório da dengue ocorrendo, conta o Coordenador da Neurologia do Hospital Japonês Santa Cruz.
“A vacina é uma grande solução” diz Penalva. “Muitos quadros de arboviroses (como febre amarela) foram controlados com vacina.”
Fonte: Folhapress (Thais Porsch)