O calor extremo que atinge parte do país neste mês pode gerar novas pressões sobre os preços de alimentos mais sensíveis a variações climáticas, dizem economistas. É o caso de itens de hortifrúti, cuja inflação costuma responder de modo mais rápido a reduções na oferta de produtos.

“Em locais onde a onda de calor está mais intensa, pelo menos entre o Sul e o Sudeste, pode ser que tenha algum aumento de preços de alimentos in natura, o que é normal para essa época do ano, só que pode vir um pouquinho acima da média por conta da intensidade do calor”, afirma o economista André Braz, do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas).

Segundo ele, a tendência é de que o impacto não seja duradouro. Em outras palavras, a perspectiva é de que a atual onda de calor não encareça os alimentos durante o ano inteiro, aponta Braz.

Jackson Bittencourt, coordenador do curso de economia da PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná), também afirma que hortaliças e frutas podem mostrar elevação de preços em razão do aumento das temperaturas no início deste ano.

“Em março e abril, possivelmente a gente sinta um aumento nos preços em razão das ondas de calor recentes”, prevê o professor.

Aniela Carrara, pesquisadora de macroeconomia do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), da Esalq/USP, afirma que o tamanho das eventuais pressões dependerá da duração do fenômeno climático.

Quanto mais tempo levar a atual onda de calor, mais a população tende a sentir os reflexos no bolso, diz Aniela, que também é professora da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos).

“Os produtos mais sensíveis tendem a refletir mais a elevação de preços por redução de oferta. Hortifrútis, de modo geral, acabam sentindo mais as mudanças extremas”, avalia.

Nesta quarta-feira (19), a Climatempo afirmou que a onda de calor persiste no Brasil e age “com força” no Sudeste, mantendo as temperaturas em nível “muito acima do normal” nos estados da região.

Conforme a previsão, o fenômeno deve continuar no Sudeste até segunda (24). O calor tende a seguir intenso mesmo com um possível enfraquecimento no fim desta semana.

Já o agrometeorologista Marco Antonio dos Santos, da consultoria Rural Clima, prevê que o evento extremo se estenda até meados da próxima semana.

Ele afirma que a situação dificulta o avanço do plantio de culturas como o milho safrinha em parte do país, mas evita falar em quebra de safra.
Para Santos, a onda de calor pode gerar uma redução momentânea na oferta de alguns alimentos, mas sem grandes impactos no longo prazo, por se tratar de um evento transitório.

As temperaturas elevadas também afetam a produção de ovos. Em nota, a ABPA (Associação Brasileira de Proteína Animal) disse na terça (18) que o calor extremo tem “impacto direto na produtividade das aves, com reflexos na oferta de produtos”.

A nota da entidade empresarial trata da recente alta dos preços dos ovos, que assustou consumidores. De acordo com a ABPA, a carestia é sazonal e costuma ocorrer antes e durante a Quaresma.

“Após longo período com preços em baixa, a comercialização de ovos aqueceu pela demanda natural da época, quando há substituição de consumo de carnes vermelhas por proteínas brancas e por ovos”, afirmou a associação.

A inflação da comida virou dor de cabeça para o governo Lula (PT) devido ao potencial dano à popularidade do presidente, que estuda medidas para reduzir os preços.

Economistas, contudo, veem pouco espaço para ações eficazes, já que a carestia recente esteve associada a fatores como problemas climáticos, além do dólar alto em meio a incertezas fiscais.

A alta dos alimentos afeta sobretudo a população pobre. Esses consumidores destinam uma fatia maior do orçamento, em termos proporcionais, para a compra de produtos básicos.
Analistas afirmam que um dos fatores que podem gerar algum alívio para a inflação dos alimentos em 2025 é a previsão de safra recorde de grãos.

Segundo a estimativa mensal do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a produção deve alcançar 325,3 milhões de toneladas neste ano. O volume previsto é 11,1% maior do que o registrado em 2024 (292,7 milhões de toneladas).

A estimativa, divulgada na semana passada, é relativa a janeiro. O levantamento ainda não contabilizou perdas de safra com a falta de chuvas no Rio Grande do Sul.

Folhapress