A linhagem B.1.1.529 do novo coronavírus foi classificada como variante de preocupação pela Organização Mundial da Saúde (OMS) nesta sexta-feira (26). A decisão é fruto de uma reunião de urgência convocada pelo grupo de trabalho sobre a Covid-19 da OMS. No comunicado, a OMS também definiu o nome técnico da nova variante: Ômicron.

Identificada em múltiplos países, segundo a OMS, a linhagem tem preocupado cientistas por ter muitas mutações que podem conferir vantagens ao vírus. A cepa foi encontrada na África do Sul, em Botsuana, em Hong Kong e na Bélgica. Até o momento, não há registros da variante no Brasil.

Entenda as três classificações de variantes pela OMS

A Organização Mundial da Saúde (OMS) realiza o monitoramento global contínuo das variantes do novo coronavírus. As linhagens são classificadas em diferentes níveis, considerando aspectos de transmissibilidade e risco à saúde.

São três classificações “variantes de preocupação”, “variantes de interesse” e “sob monitoramento”.

A classificação das “variantes de preocupação” reúne as linhagens do novo coronavírus que apresentam alterações que podem afetar as propriedades do vírus, com uma ou mais implicações, incluindo o aumento da capacidade de transmissão ou da gravidade da doença, além de impactos para a eficácia das vacinas, medicamentos e métodos de diagnóstico.

Atualmente, são consideradas variantes de preocupação a Alfa (B.1.1.7), do Reino Unido, a Beta (B.1.351), da África do Sul, a Delta (B.1.617.2), da Índia, a Gama (P.1), do Brasil, e a Ômicron (B.1.1.529), de múltiplos países, segundo a OMS.

Uma cepa do SARS-CoV-2 é considerada uma variante de interesse quando apresenta mutações no material genético com implicações no comportamento do vírus estabelecidas ou suspeitas, como a alta incidência de transmissão em uma localidade, múltiplos casos relacionados à linhagem e a detecção em vários países, por exemplo. Por isso, elas são monitoradas e podem ser reclassificadas como “variantes de preocupação”.

São classificadas como variantes de interesse as linhagens Lambda (C.37), originária do Peru, e Mu (B.1.621), detectada na Colômbia.

Já a classificação “sob monitoramento” é destinada às cepas com alterações genéticas suspeitas de afetar as características do vírus com alguma indicação de risco futuro, mas cuja evidência de impacto epidemiológico não está clara no momento. Para essas variantes, que são oito no momento, é exigido monitoramento aprimorado e avaliação contínua até novas evidências.

A partir da identificação, realizada por meio do sequenciamento genômico do vírus, cientistas buscam responder diferentes questões como a capacidade de transmissão, o aumento da letalidade e se há algum tipo de redução da eficácia das vacinas desenvolvidas contra a Covid-19.

Até o momento, os cientistas detectaram que a variante B.1.1.529 apresenta diversas mutações, o que pode indicar vantagens ao vírus, como uma potencial maior transmissibilidade e o escape dos anticorpos.

No entanto, estudos adicionais são necessários para responder se a nova variante poderá trazer algum tipo de impacto para a eficácia das vacinas contra a Covid-19 em uso no mundo.

Grande número de mutações

A variante B.1.1.529 apresenta uma ampla gama de mutações. De forma isolada, essas mutações podem tanto trazer vantagens ao vírus, como uma capacidade maior de transmissão ou do escape do sistema imunológico, como não representar qualquer tipo de ganho para o microrganismo.

“O que mais chama atenção é que a variante tem um número grande de mutações, são pelo menos 32. Ela tem várias mutações que nós já enxergamos em outras variantes que foram importantes ao longo do tempo, como a variante Alfa”, explica o virologista Fernando Spilki, pesquisador da Universidade Feevale, do Rio Grande do Sul.

Segundo o pesquisador, além das mutações, a nova variante apresenta uma característica chamada tecnicamente de deleção. Por serem estruturas muito simples, os vírus contam com uma grande capacidade de modificação. Em meio a essas alterações genéticas surgem as deleções, que são caracterizadas pela retirada de um ou mais nucleotídeos (que são os blocos que formam o RNA ou o DNA) de um gene.

O virologista explica que a variante apresenta pelo menos três deleções no material genético da proteína Spike, que é utilizada pelo vírus para invadir as células humanas, parte fundamental do processo de infecção pela Covid-19.

“Uma deleção que me chamou a atenção foi a da altura dos aminoácidos 69 e 70, que era encontrada na variante Alfa, identificada no Reino Unido. A variante também tem a mutação N501Y, muito característica da variante Gama, que também aconteceu nas linhagens da variante Beta. Ela também tem a mutação E484A, o que demonstra que a cepa está ‘mutando’ em vários ‘sítios’ que já tínhamos mapeado ao longo do tempo”, explica.

O que se sabe sobre a transmissibilidade

Uma das principais preocupações dos cientistas com o surgimento de uma nova variante é descobrir se existe maior capacidade de transmissibilidade, o que pode levar aos surtos da Covid-19.

Segundo o virologista da Universidade Feevale, Fernando Spilki, ainda são necessários estudos aprofundados que possam responder a questão em relação à variante B.1.1.529. No entanto, o especialista aponta que a linhagem tem apresentado uma ampla disseminação nas localidades onde foi detectada até o momento.

“Nos locais onde a variante ocorreu, de duas semanas pra cá, ela evoluiu para 90% das detecções, incluindo locais onde a variante Delta, altamente transmissível, já havia se disseminado e estava provocando aumento de casos. A variante B.1.1.529, mesmo assim, hoje predomina com 90% das detecções”, explica Fernando.

Impacto para a eficácia das vacinas permanece desconhecido

O pesquisador Fernando Spilki pondera que o entendimento dos impactos das mutações em características como a transmissibilidade, letalidade e eficácia das vacinas contra a Covid-19 depende de estudos adicionais.

“Essas mutações não querem dizer que tenhamos uma situação crítica. Precisamos testar, tanto in vitro quanto in vivo quais os efeitos desse acúmulo de mutações, é algo que precisa ser investigado”, acrescenta.

Segundo o virologista, a África do Sul conta com um programa eficiente de sequenciamento genômico das amostras do novo coronavírus, o que permitiu a identificação da nova variante ainda com um número baixo de casos.

No entanto, o rápido aumento no número de casos, ao longo de novembro, na província de Gauteng, onde fica a cidade de Joanesburgo, tem chamado a atenção das autoridades de saúde locais.

O sequenciamento do genoma revelou que a variante B.1.1.529 foi responsável por todas as 77 amostras de vírus analisadas em Gauteng, coletadas entre 12 e 20 de novembro. Centenas de outras amostras estão sendo analisadas no momento.

CNN