Stewart Adams sabia que havia encontrado um possível novo analgésico quando se curou de uma ressaca pouco antes de fazer um discurso importante.

“Eu era o primeiro a falar e estava com um pouco de dor de cabeça depois de uma noite com os amigos. Então tomei uma dose de 600 mg, só para garantir, e achei que foi muito eficaz.”

Adams morreu na última quarta-feira, aos 95 anos. Aos 92, o farmacêutico relembrou em entrevista à BBC os anos de pesquisa, os testes intermináveis de compostos e as muitas decepções antes de ele e sua equipe chegarem ao ibuprofeno.

Desde a aprovação e comercialização da droga, há 50 anos, o ibuprofeno tornou-se um dos analgésicos mais populares do mundo. É difícil encontrar um armário de remédios que não tenha esses comprimidos.

Está com febre? Dor de cabeça? Dor nas costas? Dor de dente? Então é provável que o ibuprofeno seja a droga escolhida para tratar seus sintomas porque é de ação rápida e está disponível até em supermercados.

O Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido alerta, no entanto, que o medicamento deve ser tomado na menor dose e pelo menor tempo possível, já que pode causar efeitos colaterais como náuseas e vômito.

Sua popularidade para o tratamento de dores não é apenas um fenômeno em território britânico. Na Índia, por exemplo, é a escolha preferida para febre e dor e, nos Estados Unidos, tem sido um medicamento de venda livre desde 1984. Também é usado para tratar inflamação em doenças como a artrite.

E, como o próprio Adams notou em uma viagem ao Afeganistão na década de 1970, até as remotas farmácias da aldeia ao longo do passo Khyber vendiam sua descoberta.

A procura por um desafio

Tudo começou com um garoto de 16 anos de Northamptonshire, na Inglaterra, que deixou a escola sem um plano certo para o futuro.

Ele foi ser aprendiz em farmácia na Boots, hoje uma grande rede do ramo, e a experiência o levou a buscar uma licenciatura em farmácia na Universidade de Nottingham, seguida por um doutorado em farmacologia na Universidade de Leeds, antes de retornar ao departamento de pesquisa da Boots, em 1952.

Sua missão na época era encontrar um novo tratamento para artrite reumatoide que fosse tão eficaz quanto um esteroide, mas sem os efeitos colaterais.

Ele começou a analisar os anti-inflamatórios e, em particular, o modo como a aspirina funcionava, o que ninguém mais parecia estar fazendo.

A aspirina foi o primeiro anti-inflamatório não esteroide a ser desenvolvido, em 1897. Embora fosse comumente usada como analgésico na época, ela tinha de ser administrado em doses muito altas, de modo que o risco de efeitos colaterais, como reação alérgica, sangramento e indigestão, era grande. Isso significava que, nos anos 50, ele estava caindo em desuso no Reino Unido.

Dez anos de pesquisa

Na busca por uma alternativa, Adams recrutou o químico John Nicholson e o técnico Colin Burrows para ajudá-lo a testar a potência de mais de 600 compostos químicos. A chave era encontrar uma droga que fosse bem tolerada pelo corpo.

Da sala da frente de uma antiga casa vitoriana nos subúrbios de Nottingham, a pequena equipe testou pacientemente os compostos até encontrar algo que valesse a pena submeter a testes clínicos.

Adams percebeu que suas chances de sucesso eram mínimas, mas ele e sua equipe perseveraram por 10 anos.

“Achava que nós teríamos sucesso eventualmente – eu sempre senti que seríamos bem sucedidos.”

E ele estava sempre preparado para agir como cobaia, testando dois ou três compostos em si mesmo.

Adams admitiu que isso nunca seria permitido nos dias de hoje, mas disse que pelo menos eles tiveram o cuidado de realizar testes de toxicidade de antemão.

“Foi importante testá-los e fiquei empolgado em ser a primeira pessoa a tomar uma dose de ibuprofeno.”

Durante aquele período, quatro drogas foram para testes clínicos e falharam antes de que, em 1961, eles chegassem ao composto chamado de ácido 2-(4-isobutilfenil)propanoico ou ácido isobutilpropanoicofenólico, que mais tarde se tornaria o ibuprofeno.

Uma patente para a substância foi concedida a Boots em 1962 e aprovada como medicamento de prescrição sete anos depois.

De acordo com Dave McMillan, ex-chefe de desenvolvimento de saúde da Boots Reino Unido, o ibuprofeno foi uma droga extremamente importante para a empresa.

“Isso salvou a Boots, ajudou a expandi-la para os EUA e para todo o mundo. Era a droga número um da Boots.”

Incríveis 20 mil toneladas de ibuprofeno são produzidas todos os anos por uma série de empresas sob diferentes marcas. Existem formatos distintos também, incluindo doses líquidas desenvolvidas especificamente para crianças.

Adams foi homenageado por sua pesquisa com um doutorado honorário em ciência pela Universidade de Nottingham e duas placas da Sociedade Real de Química. Ele permaneceu na Boots pelo resto de sua carreira, tornando-se chefe de ciências farmacêuticas.

O que mais lhe agradava é que centenas de milhões de pessoas em todo o mundo tomavam o remédio que ele descobriu.

Foi um longo caminho — e tudo começou com uma dor de cabeça.

Como o ibuprofeno funciona?

É um medicamento anti-inflamatório não esteroide. Porque tem uma estrutura química diferente dos esteroides, o ibuprofeno não é tão tóxico.

Ele reduz a dor ao mirar em compostos chamados prostaglandinas, que causam inflamação no corpo. A inflamação pode causar inchaço, calor, vermelhidão, perda de função, febre e dor.

O efeito analgésico começa logo após a dose ser tomada, mas pode levar mais tempo para a inflamação diminuir.

O sucesso do ibuprofeno tem sido no tratamento de pequenas dores. Mas, como todo medicamento, ele tem efeitos colaterais, principalmente se seu uso for contínuo. Riscos de ataques cardíacos e abortos estão entre eles, além de reações menos graves, como náuseas e vômito.

No ano passado, pesquisadores da Universidade de Copenhague constataram outros efeitos do uso prolongado do ibuprofeno, como infertilidade masculina, perda muscular, fadiga e disfunção erétil.

G1